06/01/2012

Mudança de ares

porque há ares que vem para o bem.

30/12/11

Entrei silenciosamente. O zelador não tirava os olhos de mim: bermuda jeans, cabelo com pontas vermelhas, mochila de couro preta.... não é bem a indumentária religiosa. Sento-me em um banco na lateral, próximo ao altar frontal. Faço algumas preces e agradecimentos. Parece que não fazê-los é desrespeitoso...

Ao terminar meu momento meditativo, continuo quieta, apreciando a nave, seus vitrais, o presépio. Em seguida, um senhor entra pelos fundos do altar, vai até ao microfone central e dá batidinhas para testá-lo. Passa pelo púlpito e encaminha-se a um dos vários tronos de madeira enfileirados nas paredes laterais com suportes de madeira e genuflexórios, deposita sua bíblia sobre o apoio de madeira, senta-se na enorme cadeira, e assim permanece por alguns segundos. Une as mãos cruzando os dedos e profere algumas palavras de fé. A minha distância só permite perceber o movimento de seus lábios santos. Então ele descruza as mãos, abre a pequena bíblia, folheia por algumas páginas e se detém em uma página especial. Lê algum trecho, tira os olhos do livro sagrado e olha para o nada, pensativo. Segundos depois, coloca uma das mãos no queixo, em uma pose meditativa, franzindo levemente o entrecenho. Permanece assim longos segundos, admirando o pensamento, tentando ouvir o q ele tem a dizer. Então, Dom Hypólito, que veio da Itália e até a idade de hoje falava com sotaque, que naquela ocasião vestia túnicas brancas, que tinha ainda muito cabelo, todo ele branco, e que tinha a cabeça ligeiramente inclinada pelo peso dos anos, fecha o livro e também os olhos. Ora com movimentos preguiçosos da boca, numa alternância de oração em voz baixa e apenas mental. Continua nesse gesto em oração, porém às vezes com os olhos fechados e às vezes com eles abertos, como se não se sentisse seguro por muito tempo, ou talvez a desconfiança seja um hábito. Minutos depois, duas pessoas passam entre as fileiras de bancos para os fiéis do centro da nave e o púlpito. Uma, e depois outra. As duas tiram a atenção do padre momentaneamente. Mas ele continua lá, sentado, sem pressa. 

Me levanto, e me encaminho silenciosa e vagarosamente à saída. Os olhos do zelador não me perseguem mais. Já não sou ofensiva. Adoro igrejas.

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